domingo, 24 de dezembro de 2017

Os melhores discos de 2017 por Julio César Magalhães.


Ao longo de algumas semanas, o Julio César Magalhães vem publicando no Facebook os melhores discos de 2017. Mas quem é Julio? Um dos maiores conhecedores de boa música que frequenta a Locomotiva Discos. Vocalista da banda Orange Disaster, ele também trabalha na Casa Elefante, um café alternativo na Santa Cecília em São Paulo, SP. Segue abaixo os 30 melhores discos de 2017 em ordem decrescente, logo depois da foto do próprio Julio. Segue também link da playlist que ele fez no Spotify.

























30. Annie Hardy - Rules
Tem um monte de gente na internet que outras pessoas vivem dizendo que é o máximo, então essa é a minha vez: essa moça perdeu o filho pequeno e o marido, tudo em menos de 3 meses. E fez esse disco tomado e furioso baseado na experiência. Qual é mesmo seu feito fodão do ano de que vc estava falando?

29. Thurston Moore - Rock'n'Roll Conciousness
Depois da sua queda do olimpo de modelos de cabelo e vida do mundo indie, uma coisa não mudou: Mr. Moore continua tocando PRA CARAMBA. 2017 o encontra alcançando níveis Neil Young 70s de habilidade de fazer guitarras falarem, e a pessoal que o acompanha não está um centímetro atrás do homem. As músicas são longas, furiosas e cheias do senso de transcendência a que o título do disco se refere.

28. Weirds - Swarm Culture
A estranha mistura de Stone Roses e Killing Joke desse trio é basicamente tudo que o Kasabian sempre tentou fazer sem sucesso, mas com nada da frescura hypster e cortes de cabelo zoados bem mais legais. Lembram que no fim noise rock é só outra forma de pós-punk e que ainda é possível ser ultra agressivo sem vulgaridade.

27. Nadine Shah - Holiday Destination
Resumindo: Nadine Shah é a mulher que grava os discos que a PJ Harvey faria se ainda se importasse. Sim, ela é boa assim. Na verdade, é melhor.

26. Zola Jesus - Okovi
Após breve flerte com o mundo dos clones da Bjork, Mrs. Danilova voltou ao que faz melhor: uma mistura peculiar de eletrônico e do lado dançante do gótico. Ajuda ela também ter voltado à Sacred Bones, a gravadora com o logo mais legal da nossa era.

25. Uniform - Wake In Fright
Música de protesto com abrasividade no 12, letras retas e aquela batida gentil como um tijolo esfacelando na porta de vidro de uma agência de banco. Pode até ser simplista, mas convence.

24 - Contributors - Contributors
Colaboração entre o inglês cult Dan Melchior e a banda No Wave texana Spray Paint. Se o Crazy Horse resolvesse regravar Autobahn, acabaria com algo bem parecido com isso. O fato de que esse disco entrou aqui 20 min depois que terminei de ouvir pela primeira vez diz o quanto a ideia é bem executada. Ou encaixa nos meus gostos.

23 - Marvin Pontiac - Asylum Years
E o melhor bluesman clássico que vc nunca ouviu - na verdade um projeto zoeira na época mas hj dolorosamente a sério do ex-lider dos lounge lizards, john lurie - voltou pra mostrar pro pessoal da light in the attic quem manda no mundo dos discos perdidos mega ecléticos. Tem blues, tem soul, tem throat singing tibetano, tem algo de Kendrick bem subjacente e tem muita tristeza, beleza e orgulho.

22 - Damnation A. D. - Pornography
Sim, é uma regravação completa do disco mais sombrio da trilogia das cores do Robert Smith. Os mestres do metalcore neurose já tinham gravado algumas músicas do disco esporadicamente, e esse ano se juntaram pra acabar o trabalho. Curiosamente, apesar da gritaria, distorção e raiva, existe um certo senso de transcendência no fundo dessa versão. Como se o que confessadamente foi gravado como uma fantasia de depressão pelos seus criadores tenha se transformado pela mão da banda de Washington em uma purgação de seus próprios problemas pessoais. Se no original a coisa terminava com o ouvinte se sentindo à beira de um abismo sem fim, aqui existe claramente o sentido de que mesmo cruzando um oceano de problemas e dor, existe esperança à frente.

21 - Unsane - Sterilize
Esse é um disco do Unsane. Como os tubarões, o trio de ny nunca demonstrou necessidade de algo no estilo de evolução pra reinar, se limitando a voltar a cada par de anos explodindo as barreiras entre hardcore, metal e noise rock e fazendo toda a concorrência, por mais jovem que seja, parecer cansada e ultrapassada em comparação.

20 - bad breeding - divide
Se a volta dessa alegre turba de arruaceiros ingleses perde um pouco da agressão crua da estreia, se ganha muito em termos de textura e ainda mais microfonia. Um passo pra o lado pra dar um pra frente, se preferirem.

19 - Boss hog - Brood x
E o retorno da banda de noise funk mais elegante de nova iorque continuou. Influenciado pelo inicio do reich de Trump, as coisas estão ainda mais ferozes, sinistras e dançantes no mundo de Jon Spencer e Christina Martinez. Esperamos que não levem mais 10 anos pra o próximo.

18 - Grave Pleasures - Motherblood
Os mestres do euro hard goth voltaram pra mostrar c quanta farofa e pompa se faz o death rock de verdade. Diversão garantida, com destaque para o cosplay campeão de Killing Joke em 'Atomic Christ'.

17 - Wire - Silver / Lead
A produção é constante no campo daquela que o Rogerio Real considera a melhor banda de todos os tempos. Outro disco legal de mestres do 'art rock meio punk com toques de britpop e eletrônica' que estimula a mente, relaxa o corpo e tem momentos q vão impressionar quem se arriscar a jogar alguma coisa deles na pista.

16 - Part Chimp - IV
É, o rock parece mesmo estar em crise - qdo não esteve? - , mas esse povo esta fazendo o máximo de dentro de sua bolha pessoal pra manter o moral elevado. Pesado, entupido de riffs burros de primeira e energia, esse é um disco que vai lhe tirar d inferno de 'mas, porém' que 2017 foi e lhe levar pra um lugar melhor.

15 - Makthaverskan - III
Tem pós-punk, tem shoegaze, tem power pop. Só não tem tédio. No meio termo entre o Cocteau Twins e os Primitives está o lugar onde o Makthaverskan quer estar. E eles dão conta dessa bagunça toda, e sem ficar c cara de frankstein...

14 - Oxbow - Thin Black Duke
Após um longo inverno, Eugene & cia voltaram diferentes. Ainda tem bastante barulho e estranheza, mas também um senso de leveza e entretenimento ausente do trabalho anterior. Uma determinada melancolia, chegaria a dizer. Curiosamente, remete mais aos discos do Pere Ubu dos anos 90 que ao do Bowie referendado no título. Sensual sem ser vulgar, e isso vindo de gente que anteriormente tinha transformado o 'ser vulgar' em sua própria forma de arte. E tem algo como sinos, em algum lugar.

13 - Last Night - Friendly Fires
Ótima banda francesa, juntando o melhor dos anos 00 e do pós-punk original, lindo pra fazer uma pista bombar, grande trabalho de guitarra. Se não fosse esse nome genérico e horrendo, poderiam ir longe. Aliás, devem ir longe assim mesmo...

12 - Dead Cross - Dead Cross
Dave Lombardo já tinha participado de uma formação do Fantomas mas esse projeto novo eleva o poder de destruição que a união de seu estilo brutal de tocar bateria e do espetáculo de esquizofrenia musical que são os vocais de Mike Patton podem alcançar juntos. A presença de membros do The Locust e Retox ajudando a ampliar o caos também ajuda...

11 - Metz - Strange Peace
Cada vez mais alienados do rockão, esse trio pode estar avançando profundamente no barulho e experimentação, mas a intensidade com que atacam seus instrumentos permanece a mesma. Abstração é uma energia?

10 - Träd, Gräs Och Stenar - Tack För Kaffet [So Long]
Após mais de 30 anos parados, esses pioneiros do drone pre-shoegaze voltam uma última vez - o 'adeus do título é aos dois membros da banda que morreram antes da volta se concretizar, então de certa forma ele támbem é uma elegia a eles - preparados pra mostrar com quanta repetição se faz uma leva de shoegazers cinquentões levitarem pelo espaço.

09 - Black Angels - Death Song
A cada dois ou três anos esses texanos voltam, sempre encontrando novas maneiras de misturam a psicodelia e o rock de garagem de forma inusitada. Em um disco iminentemente político, eles usam sua parede de guitarras pra atacar o falso patriotismo ('i'd kill for her'), a cobiça ('currency') e a apatia ('half believing') que tomaram conta do mundo nos últimos dois anos.

08 - Bjorn Torske and Prins Thomas - Square One
Diz a lenda e o release da gravadora que esses dois caras ganham uma graninha legal como djs de house. Aqui, eles ficam entre o pós punk instrumental de discos cult como 'my life in the bush of ghosts' e 'nommos' e a faceta mais avoada do dub do começo da on-u-sound. Excelente acompanhamento para viagens, físicas ou mentais...

07 - Dream Syndicate - How Do I Find Myself Here?
Quase 30 anos foram o tempo que levou pra Steve Wynn resolver voltar à alcunha que o tornou famoso. Os elementos básicos continuam lá: as guitarras distorcidas e viajantes, as canções de primeira, o humor sardônico. Mas o novo disco demonstra uma alegria de viver e uma satisfação consigo mesmo que eram ausentes na versão mais nova do vocalista. Algumas vezes a maturidade vem pra melhor.

06 - Chelsea Wolfe - Hiss + Spun
Acentuando a guinada pra um som mais pesado indicada no álbum anterior, Mrs. Wolfe pega pesado nas guitarras, com colaboração de membros do Queens of The Stone Age e Isis. Talvez o disco gótico mais metal do ano, ou o de metal mais gótico. Indiferente da sua escolha de ordem, é mais um passo em uma carreira vencedora.

05 - Black Asteroid - Thrust
Cobrindo o espaço entre o melhor da EBM e do techno, Bryan Black ajuda a reviver a música de pista pra dançar de cara fechada e óculos escuros em algum porão anônimo, com vocais de luminares (sic) da nova música gótica como Zola Jesus e Cold Cave. Diversão garantida, com estilo e personalidade.

04 - Sonic Death - Space Goth
Muitos são os chamados pra o topo das escala das novas bandas de garage psicodélico, mas esse agora trio russo é que foi O escolhido. Energia, riffs, efeitos, atitude: eles tem tudo. Não é só na corrida por influência política que os americanos tem de começar a ficar espertos...

03 - Nicole Sabouné - Miman
Após despontar no ídolos sueco e gravar um álbum bem interessante de pop esquisito (meio Kate Perry, meio Joy Division, se puderem imaginar essa mistura), essa jovem cantora resolveu partir pra um passo mais ambicioso: se tornar a próxima Nico. Não a do 'Chelsea Girls' - já tem tantas - mas a dos discos do fim de carreira, como 'Camera Obscura' e 'Drama Of Exile', portadora de uma música tão claustrofóbica qto dançante. Os detalhes de Stoner e eletrônico adicionados pra dar uma cara moderna ao produto funcionam à perfeição e o disco foi comprado pela Century Media pra distribuição internacional. Um excelente disco, e talvez o começo de uma grande carreira.

02 - Hey Colossus - The Guillotine
Em meio a tantos grupos de stoner celebrando o fim do mundo através da vinda de bruxas e feras sobrenaturais, esses ingleses preferem monstros mais próximos do dia a dia: racismo, alienação e ódio. E, a bem da verdade, sobrou bem pouco de metal aqui: o peso e agressividade da música e letras tem mais a ver com o Nick Cave & The Bad Seeds do que com o Black Sabbath. A Inglaterra pós-Brexit transformada em música.

01 - Shilpa Ray - Door Girl
O que é rock em 2017? Poderia cita o Iggy Pop e dizer que, do alto dos meus 42 anos, não sou a pessoa mais indicada pra dizer a alguém o que é a mais nova sensação. Mas se vcs quiserem mesmo saber, tem essa moça que escreve com fluência sobre o inferno de não ter chegado lá - e nem mesmo ter certeza de onde 'lá' é - e consegue cantar como um anjo, enquanto sua banda recupera o melhor do que o rock de NY criou desde Ronnie Spector a Johnny Thunders. Mas só se vocês quiserem mesmo saber. E não querem.


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